Zeca Afonso – O cantautor da liberdade [Arquivo]
José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos.
Quem, perguntam vocês?
Professor, explicador, estudante, revisor do Diário de Coimbra, futebolista, compositor, músico, cantor e educador de consciências. Fazemos a homenagem na Scratch Mag no 29º aniversário da sua partida.
Por Lino Galveias
Filho da dª Maria das Dores e do sr. José Nepumoceno, Zeca Afonso nasceu em Aveiro no dia 2 de Agosto de 1929. Passou depois por Angola, que o vinha a marcar profundamente, Moçambique, Belmonte com um tio admirador do regime ditatorial de então, até que foi cursar o Liceu e a Faculdade (Histórico-Filosóficas) em Coimbra.
Foi à beira do Mondego e da sua vizinha Sé Velha que José Afonso se envolve no Orfeão Académico e na Tuna Académica. Era também famoso intérprete exímio da Canção de Coimbra, jogando ainda futebol na Académica.
Enquanto estudava e dava explicações, Zeca casa à revelia com Maria Amália e tem o primeiro filho José Manuel. Grava e edita o EP Coimbra em 1953 e mais tarde cumpre o serviço militar obrigatório e começa a dar aulas em diversas localidades, continuando a gravar e editar como compositor da canção coimbrã.
Ainda em Coimbra conhece Manuel Alegre e Adriano Correia de Oliveira, importantes membros da oposição ao regime político de então. Já nos anos 60 começa a seguir as questões estudantis de Lisboa em 1962, trabalha em Faro onde conhece e namora com Zélia, com quem viria a casar, volta a África em tournée com o Orfeão e começa a dirigir a sua música para a intervenção. Em 1963, Baladas de Coimbra (sem guitarra de Coimbra, como no fado tradicional, mas com a guitarra do jovem Rui Pato, ainda activo) integra Vampiros e Menino do Bairro Negro, marcadamente de intervenção sobre o sistema económico e sobre as condições das crianças do Barredo, no Porto, sendo o disco proibido pela censura.
Dá aulas, participa em sessões populares em Portugal (como o da Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense, mas já lá vamos) e no estrangeiro, vai residir em Moçambique onde faz teatro e começa a ter o regime à perna pela sua posição contra a ditadura e o colonialismo, mantém contactos com a oposição, volta a Portugal no final dos anos 60. É impedido de dar aulas e dá explicações, toca em festivais e vai para o exílio.
É em França que grava Cantigas do Maio e Venham mais Cinco com apoio de vários músicos portugueses (como Vitorino e José Mário Branco) e franceses. É detido em Caxias pela PIDE. Recebe prémios por Cantares do Andarilho (melhor disco e interpretação) no I Festival da Canção Portuguesa no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, a 29 de Março de 1974. Ironicamente, a censura (notificada apenas uma hora antes em relação às músicas cantadas) deixa passar Grândola, composta em homenagem ao povo de Grândola após a actuação na Sociedade Operária local e em jeito de Cante Alentejano, cantada por todos os presentes.
Foi precisamente a irónica a metafórica, esperançosa Grândola que foi escolhida pelas Forças Armadas como segunda senha da revolta que se pôs em marcha entre 24 e 25 de Abril de 1974, ajudando a fazer cair o regime e a começar um novo momento político e cultural em Portugal.
Continua a editar e cantar após o 25 de Abril. Edita discos, actua em Portugal e no estrangeiro, continua intervindo politicamente, como nas sessões culturais do MFA, recusa a distinção da Ordem da Liberdade em 1983 e, em Janeiro daquele ano, dá os últimos concertos nos coliseus de Lisboa (que seria filmado e editado em disco) e Porto. É precisamente no de Lisboa que junta vários amigos e canta a Canção de Coimbra e a intervenção, juntando o povo na Grândola. Já estava, porém, debilitado pela Esclerose Lateral Amiotrófica que o afectava e lança o último disco, Galinhas do Mato, em 1986. Já pouco canta mas junta diversas vozes e influências, como Fausto, Sérgio Godinho, entre coros e as filhas de Janita Salomé, Marta e Catarina.
Viria a falecer em consequência da doença em Setúbal a 23 de Fevereiro de 1987 mas continua vivo na cultura portuguesa, sendo cantado continuamente e gravado um disco, Filhos da Madrugada, por músicos portugueses nos anos 90, bem como nos mais recentes protestos.
Não só cantou Coimbra ou a intervenção sócio-política, mas também juntou a melodia das guitarras à percussão da Beira Baixa, adicionou uma pitada de música africana (que Zeca considera semelhante aos ritmos da Beira Baixa) e até de influências orientais (Canção da Paciência). Desenvolveu, assim, numa bela caldeirada, a música popular portuguesa e deu a conhecer ao grande público muitos outros músicos como Júlio Pereira, Rui Pato, Francisco Fanhais e tantos outros.
É celebrado por artistas portugueses e estrangeiros e, a 18 de Novembro de 1987 é criada a Associação José Afonso que mantém a sua chama viva com a realização de projectos educativos e culturais.
O que faz falta é animar a malta!
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