The Indies# Simple Minds no Coliseu: “Noite de New Wave”
Tendo como objectivo inicial relatar apenas a minha experiência do concerto da banda escocesa em Portugal no passado dia 14 de Fevereiro, houve no entanto a necessidade de fazer alguns ajustes ao texto, dadas as reacções que entretanto fui lendo sobre o concerto.
Por Bruno Vieira
Depois de baralhar e voltar a dar, aqui fica a história do mesmo:
Anunciado claramente em diversos órgãos de comunicação social como um concerto em que a banda de Jim Kerr iria revisitar os primeiros cinco álbuns da sua carreira (tocando cinco músicas de cada um deles), estava dado o mote para uma noite de pura new wave, marcada pelo som dos sintetizadores mas onde as guitarras se fizeram ouvir e bem, não afastando de todo uma audiência mais rockeira. O facto da banda não tocar os grandes clássicos de meados dos anos 80 e inícios de 90, seria um mero acidente de percurso tendo em conta os objectivos desta digressão de 16 datas, que começou em Lisboa e irá terminar no dia 4 de Março na Irlanda. Não foi de facto um concerto em formato best-of para um público mainstream (onde a escolha de um espaço como o Campo Pequeno ou o Pav. Atlêntico seriam mais apropriados), mas sim um concerto para fãs ou então verdadeiros interessados por música, um evento de culto único, que definitivamente não era para todos, daí ter sido escolhido um espaço bem mais pequeno, como o Coliseu de Lisboa.
O interesse pela new wave (de um modo geral) já vem de longe, pese embora conhecesse pouco mais de uma dezena de músicas da banda relativas a este período, graças a “Glittering Prize” (o meu primeiro best-of) e de mais alguma pesquisa por conta própria. Não posso afirmar que o período mais mediático da banda me tenha passado ao lado, mas o gosto pela descoberta deste passado menos conhecido, fez do concerto de terça-feira uma espécie de “cereja no topo do bolo”.
Com 25 músicas previstas no alinhamento e uma sala praticamente lotada, na qual sobressaia sem surpresa o público da faixa etária dos 40/50, os Simples Minds iniciaram a ordem de trabalhos com “I Travel”, tema de abertura do primeiro álbum da década de 80 “Empires and Dance”, seguida de “Today I Died Again” do mesmo álbum, em certa medida a fazer lembrar os Ultravox da era John Foxx. Nesta altura os Simple Minds disputavam o mesmo campeonato de bandas como INXS ou U2, que antes de atingirem o estrelato orbitavam também no universo post-punk e new wave.
Na primeira parte do concerto, realce para “Wasteland”, “Life In a Day” e sobretudo “Love Song”, provavelmente a que mais terá mexido com todos aqueles que torciam pelos grandes êxitos, e também porque o dia do concerto coincidia com o dia dos namorados. Tal como começou, a primeira parte terminaria com “Room”, tema do álbum “Empires and Dance”, ao que se seguiu um intervalo de cerca de 15 minutos, tal como anunciado antes do início do concerto.
A segunda parte abriu e fechou com temas relativamente conhecidos como “The American” e “Someone Somewhere in Summertime”. Pelo meio de referir também o imperdível “Promised You A Miracle”, o denso “Celebrate” novamente de “Empires and Dance” (encerrando as músicas tocadas deste álbum), bem como outros interessantes como “Sweat In Bullet” e “Changeling”. Fazendo bem as contas e volvidas 20 músicas tocadas, era mais que certo que as 5 que faltavam só poderiam ser tocadas no decorrer do encore. E assim foi com o instrumental “Themes For Great Cities”, seguido de “Glittering Prize” outras das mais conhecidas. Antes do terminus com “New Gold Dream” do álbum homónimo, realce para o delicioso e viciante “Chelsea Girl” do álbum “Life In Day” de 1979.
Deste concerto só posso dizer que foi uma experiência única, apenas proporcionada pelo repertório temático e rico que a banda trouxe, o que não é muito habitual já que a maioria dos concertos acabam invarialvelmente no clássico formato best-of, mais apelativo. Assim sendo quer a banda, quer a promotora, quer a própria rádio que em Portugal apoiou este concerto estão de parabéns por não terem tido receio de arriscar num espectáculo que estava longe de ser para as massas, o mesmo que dizer, comercialmente correcto.
Jim Kerr, líder da banda desde o seu início em 1977, continua um excelente performer e nem mesmo a sua voz parece acusar o passar dos anos, sendo um privilégio ver, nos dias de hoje, um músico dos tempos da velhinha new wave em tão boa forma, sem parecer decadente.
Quanto à reacção do público e apesar de algumas caras descontentes pelo facto dos grandes êxitos não terem sido tocados, a recepção à banda escocesa foi na maior parte do tempo calorosa. Mesmo para muitos que foram ao engano, terá prevalecido o facto de estarem em frente de um líder carismático de uma banda que assegurou já o seu lugar na história da música. Pode não ter havido lugar para grandes coros (salvo pontual excepção), mas houve certamente calor humano e saber receber por parte do público português, muito longe da banda ter sido vaidada como, infelizmente, já pude ler.
Neste aspecto não posso deixar de manifestar o meu descontentamento pela má publicidade que muitos pseudo fãs da banda, supostamente entendidos mas pelos vistos pouco conhecedores do seu passado, tiveram o cuidado de fazer passar. Li de tudo: “lamentável”, “isto não se faz”, “pior concerto de sempre”, “muito fraco”, “grande seca” e “enganados”. Mas o chorrilho de disparates ainda foi mais longe: desde “onde estão os êxitos anteriores a 1990?”, “não tocaram as músicas anunciadas nos spots” até “concerto para um público underground”. Curioso que alguém tenha afirmado ainda “não ter sido revisto o passado da banda”, provavelmente não terão presenciado o mesmo concerto, enfim. A todos estes peritos em Simple Minds da velha-guarda, os quais orgulhosamente ostentam no seu curriculum o concerto no Estádio de Alvalade em 1990, apenas sugiro que façam o trabalhinho de casa antes de se meterem num concerto que vai para além do óbvio. Para muita gente a carreira dos Simple Minds terá começado apenas em 1985, puro engano, antes de serem conhecidos do grande público já a banda tinha 6 álbuns editados.
Parte das críticas que se fizeram ouvir só se justificariam se se tratasse de um concerto em formato clássico, mas não foi o caso. Tudo o que se tem dito acerca do mesmo só me permite concluir que existe ainda uma faixa muito significativa de público para quem a música são meia dúzia de êxitos do passado que ficaram no ouvido e que ainda passam na rádio, e pouco mais. Nada contra, desde que não se façam passar por experts (nem sempre a antiguidade é um posto). Gostar de música não tem tanto a ver com a idade, mais pelo interesse que se demonstra pela mesma. Muito ou pouco, o que sei é mais do que suficiente para concluir que há mais vida para além dos grandes êxitos. Não gostaria de terminar sem falar da reedição dos 5 primeiros álbuns dos Simple Minds, numa edição especial que será posta à venda em Portugal no próximo dia 20 de Fevereiro. Trata-se de um documento histórico, recomendado sobretudo a fãs da banda e de new wave.
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